13 – April 2001 special issue devoted to the Guadiana Rock Art
Comunicado. Alqueva – A descoberta das gravuras rupestre na margem portuguesa do rio Guadiana
IFRAO
In English
IFRAO – INTERNATIONAL FEDERATIONS OF ROCK ART ORGANIZATIONS
Representante em Portugal: APAR – Apartado n.20 – 5001-909 Vila Real.
Resumo: Nomeação imediata de uma comissão internacional de acompanhamento verdadeiramente independente. Demissão dos responsáveis do IPA e do CNART que não verificaram o trabalho levado a cabo pela EDIA. Participação internacional do esforço de prospecção, levantamento e estudo das gravuras rupestres do rio Guadiana.
A IFRAO (Federação Internacional das Organizações de Arte Rupestre) congratula-se com a importante descoberta efectuada por membros do Movimento Cota 139, em colaboração do arqueólogo Manuel Calado da Universidade de Lisboa. Mas se por um lado a descoberta de gravuras rupestre no rio Guadiana é motivo para nós de grande regozijo ela é também por parte da comunidade cientifica internacional motivo de grande preocupação. Sendo a construção da barragem irreversível, a destruição de tão importantes achados é praticamente inevitável.
Perante tal circunstância a IFRAO, em nome de milhares de especialistas e amadores espalhados pelos 5 continentes-sócios das associações membros da nossa federação-, vem tornar público os seguintes pontos:
- A IFRAO teve conhecimento da existência de gravuras rupestres na margem espanhola do rio Guadiana (na zona afecta pelo regolfo de Alqueva) no início de Abril, em Tomar, durante o Curso de Arte Pré-histórica Europeia realizado pelo IPT. Nomeadamente quanto o colega espanhol Hipolito Collado fez apresentação pública dos estudos realizados em Janeiro e Fevereiro deste ano. No seguimento de tal comunicação a IFRAO, representada por Mila Simões de Abreu, Ludwig Jaffe, Andrea Arcà e Angelo Fossati (estes últimos da Itália) deslocaram-se à zona de Cheles (Olivença) onde constataram a importância de tal descoberta. Foi solicitado então ao colega espanhol um relatório que posteriormente foi enviado ao Presidente da IFRAO. Em tal ocasião os representantes da IFRAO não deixaram de se interrogar sobre a ausência de descobertas no lado português. Um de nós (MSA) esclareceu os colegas estrangeiros que todo o processo da minimização do património arqueológico estava a ser coordenado pela EDIA e que até então nenhum comunicado tinha sido feita sobre quaisquer gravuras desse tipo.
- A IFRAO veio agora, tal como a maioria dos portugueses, a ter conhecimento através dos média, da existência de gravuras rupestres, em território português, numa no extensão de pelo menos 10 Km idênticas as de Cheles.
Perante tais factos a IFRAO não pode deixar de constatar que alguma coisa correu profundamente errada neste processo e esclarece os seguintes pontos.
- A situação presente em Alqueva é bem diversa-talvez mais grave e escandalosa-que a de Foz Côa porque:
- A barragem está em fase avançada de construção.
- Parece que a lição da barragem do Foz Coa foi completamente esquecida com enorme prejuízo para o património rupestre e para os contribuintes portugueses que vão ter que pagar a factura desses erros.
- Existe hoje – coisa que não acontecia em 1994 – um Instituto Português de Arqueologia (IPA) e um Centro Nacional de Arte Rupestre responsável exactamente “pelo inventariar e registar (…) todos os sítios rupestres existentes em território nacional promovendo a sua conservação e divulgação”. (Decreto-lei nº117/97 de 14 de Maio). Estes organismos públicos deviam ter acompanhado o que se passava e controlado o trabalho desenvolvido pela EDIA. A IFRAO, conhecendo das posições assumidas, no caso de Foz Côa, pelo actual Presidente do IPA, Prof. Dr. João Zilhão, não entende como é que ele, que tanto criticou o IPPAR em circunstâncias semelhantes, não se tenha imediatamente demitido – demonstrando assim, como quando foi do Côa a total oposição à destruição de arte rupestre: Surpreende-nos também a incapacidade por parte do IPA de evitar situações como estas. Mais grave e’ o facto do próprio Presidente do IPA vir a público dizer que “era previsível” .O que fez então para prever tal facto? Quando ao coordenador do CNART, que estava como nós, presente em Tomar e que portanto ouviu o colega espanhol, demonstra mais uma vez falta de oportunidade e responsabilidade pois nada fez durante estas ultimas semanas para verificar a tal “previsível” presença em lado português de gravuras rupestres. A sua anunciada visita para segunda-feira, peca, portanto, pelo menos, por considerável atraso…
- A IFRAO, tal como sempre o faz, promove o estudo, a protecção e a divulgação da arte rupestre, em todos os continentes, seja qual for a época ou cultura a pertencam. Ficamos portanto mais uma vez profundamente muito preocupados com a noção de a idade das gravuras seja motivo ou não da sua destruição. Lamentamos que o Presidente do IPA tenha vindo a público, mesmo antes de ter visitado o local, e pior ainda, reconhecendo que nenhum estudo tenha sido ainda feito, dizer “as gravuras são menos importantes que as do Côa”. Como pode como arqueólogo afirmar tal coisa se nem se quer se sabe ainda dimensão e extensão dos achados?
- E’ ainda importante recordar que zonas de arte rupestre com tal dimensão (10km em Portugal 2 Km em Espanha) são sempre de grande valor e importância. Se se vier a confirmar que as gravuras são na verdade neolíticas esta descoberta torna-se ainda mais importante porque, contrariamente ao que muitos parecem quer dizer, existe um número muito reduzido de rochas gravadas entre o Neolítico-Calcolítico na Europa. Correspondendo tal período, por exemplo, às primeiras fases de Valcamónica (Itália – monumento UNESCO) e do Monte Bego (França)
A IFRAO vai enviar ao Sr. Primeiro Ministro e ao Ministro da Cultura um documento em que vai pedir que:
- Seja feita uma imediata intervenção no sentido que tudo seja feito para que as gravuras sejam estudadas da forma mais adequada e pelo período de tempo que seja necessário –mesmo que para tal seja necessário adiar ou suspender o enchimento da barragem.
- Criar uma comissão de acompanhamento dos trabalhos verdadeiramente independente de modo que se possa avaliar a sua importância e valor. Para que tal comissão seja completamente independente e sem qualquer tipo de pressões pensamos que seja indispensável que NÃO façam parte dela nem a EDIA nem tão pouco nenhum dos organismos do estado envolvidos (IPA -CNART). Não só porque demonstraram uma clara incapacidade de actuação mas também para garantir a total transparência. A comunidade internacional não iriá compreender que organismos do Estado Português sejam ao mesmo tempo, os executantes e os controladores. Essa questão foi aliás uma das mais criticadas durante Foz Côa e que acabou por conduzir a criação de uma comissão de especialistas externos. A IFRAO criou já uma comissão de emergência constituída por especialistas de 4 continentes que vão acompanhar o desenrolar da situação. Pensamos seria extremamente positivo se a comissão da IFRAO fizesse parte de uma comissão alargada do Governo, por exemplo, com representantes das Universidades Portuguesas, das associações arqueológica, nomeadamente a APA (Associação Profissional dos Arqueólogos)
- Que sejam apuradas responsabilidade no que diz respeitos aos trabalhos arqueológicos efectuados durante os últimos anos. Que demita – visto que ele não teve a coragem de o fazer – o coordenador do Centro Nacional de Arte Rupestre (CNART), principal responsável político (pecando em não controlar os trabalhos desenvolvidos pela EDIA) do que se passou até aqui.
- A IFRAO coloca a disposição do Estado Português os seus investigadores e salienta que pode enviar, em curto espaço de tempo especialistas que colaborarão com as autoridades portuguesas e que estão preparado para promover cursos de treino para arqueólogos e estudantes que estejam disponíveis para ajudar no enorme esforço que o estudo – principalmente se conduzido contra o tempo – vai representar.
- A IFRAO, não esquecendo a coragem política demonstrada pelo Sr. Primeiros Ministro Eng. António Guterres, perante o caso do Côa está interessada em dialogar de foram construtiva com as autoridades portuguesas. Vamos portanto solicitar uma audiência ao Sr. Primeiro-ministro e a Sua Excelência, o Sr. Presidente da República.
Por fim, queremos dizer a todos os Portugueses: – esta é uma descoberta que deverá ser motivo de orgulho para Portugal.
Só um povo que olha com respeito para o Passado pode olhar com esperança para o Futuro!
Mila Simões de Abreu
Representante em Portugal da IFRAO
(Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
– Unidade de Arqueologia do Dep. de Geologia)
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